sábado, julho 30, 2011

tempero a temporal a 30 de julho

ó cebola,
que agora corto
no tablado áureo
de minha clara cozinha:
escuta.

eu te amo tanto
(noves fora os violentos golpes a fio de faca
que inflijo insensível à tua frágil verdura)
que qualquer tristeza
que seja que me causas
sofrendo tu a atuação
de minha bruta mão
é um artifício
da química ação
do dióxido de enxofre
liberado nuns olhos machos
que têm de tudo
menos o serem liberados

pois eu é que te corto, entendes?
e assim mesmo eu mesmo é que choro
e tu nada mais sendo, apenas,
que o bom tempero de minha vida
refeição minha de todo dia
tu, picante iguaria
e choro eu, como pode?

ah! cebola
em cada meu bife acebolado
que extrato do meu coração tá tu
em cada glass onion
de fabulosos transes de meus romances tá tu
em cada réstia de mim mesmo
fatiada, tu picada tá tu
tu dourada em minha manteiga
ah! como tá tu, como tá tu!

cada camada que de ti descasco há
tu ali por dentro
outra de ti
em outra camada
em outro descasco
inteira sempre como fosses
só casca até o impossível centro
o interminável núcleo
ou desde fora até a casquinha derradeira
que escondes lá dentro
de tua infinita paciência
em eu fazer-me de ti meu chorar


eu te amo.
chorando eu ou não
ó cebola,
és minha toda
felicidade.
qualquer tristeza é falsa:
cortaria eu com o mesmo resultado
qualquer dobrado
de um pé de salsa

.

quinta-feira, julho 28, 2011

floresta e o futuro em 28 de julho



as estrelas, estrelas, estrelas!
curto também estrelas, amor
nas minhas ruas escuras
pela nossa floresta vazia
a floresta de ruas tão nuas

de igreja amarela tou das dores
e de assim rosa chá tou brilhando
peço pra pouso alegre alegrá
o contorno do teu corpo ausente,
eu cá, cê aí, jacuí, itajubá

as estrelas, três delas são nuvens
retornando esse amor espiral
recrescendo do chão dessa minas
do meu centro ao seu molhado sul
és e sou nosso veio mineral

as estrelas, estrelas, sou fé!
aí a igrejinha na meseta
aí as vaquinhas no sopé
e no alto daqui enevoam-se
nossas super sinuosas silhuetas

uma corujinha e dois grilos lá
retocam três notas deslocais
mis calculados e rés pirados
me aí tens aspirados fás sóis
amo e amas por tudo e por onde
e por doidos nós dois dos de nóis

.

segunda-feira, julho 25, 2011

Em que ele relata o passado no dia 26 de julho

139 dias atrás andava eu vazio
(e vazio é o copo e por isso ele é bom)
pelas ruas, passeios e esquinas
de uma cidade grande de Minas
qualquer
e tropecei em (e quase pisei e quase quebrei) uma caixinha
de música dessas antigas
de outro carnaval,
e delgada por sobre a caixinha
sobre um pedestal
uma bailarina.

139 cordas dei eu à caixinha
que mais do que música
que mais do que dança
e mais que a bailarina
a caixa de música tinha:
a caixinha falava
e com essa doida surpresa nem meus esdrúxulos sonhos
com essa nem meus mais estranhos delírios
meus mais insanos mitos
desejos secretos
contavam


139 vezes me disse ao ouvido
a caixinha
o que eu queria e não sabia
que queria
ouvir
relata-me a caixa de música
que é música a meus ouvidos
reconhecer a beleza
e a estonte
ante certeza que reata
os sonhos meus

conversa comigo a caixinha
que é mais do que música
que é mais do que dança
é mais que a bailarina
adelgaçada
suas cinzas espalhadas, reacendidas brasas
de outro carnaval
139 noites
me descem
e me invitam
ao seu pedestal

e é em isso que a ausência que ressurge
agora
do alto de suas 139 razões
de ser ausência
é mais grave e imensa que uma só não-caixinha
mais que uma só não-música
que uma só não-dança
uma não-bailarina
o falar tartamudo
o que ausenta agora de mim
é eu só sou ela




.

negra

negra
preta
escura
linda boa criatura
branca
alva
clara
mulher bela a tua cara
sensata
exata
tua perfeita escultura
quem trata
contrata
tua dança na escritura
maltrata
e afasta
de mim sempre tua figura

eu
me mordo
sangrento
atento ao tempo em que passo sem ti

negra
branca
amarela
és de todas a mais bela
preta
clara
azul
és meu norte, leste e sul
eu
me escondo verde
tarada sede
alçado ao tempo em que passo contigo

exatamente, sensatamente
pirata mente
te conto
comigo
e eu vou.
na prata da lata
no som.
à cata da gata
e é bom.
e é o melhor de se ser.
sou negra e grata por nada melhor que você.


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