sábado, julho 30, 2011

tempero a temporal a 30 de julho

ó cebola,
que agora corto
no tablado áureo
de minha clara cozinha:
escuta.

eu te amo tanto
(noves fora os violentos golpes a fio de faca
que inflijo insensível à tua frágil verdura)
que qualquer tristeza
que seja que me causas
sofrendo tu a atuação
de minha bruta mão
é um artifício
da química ação
do dióxido de enxofre
liberado nuns olhos machos
que têm de tudo
menos o serem liberados

pois eu é que te corto, entendes?
e assim mesmo eu mesmo é que choro
e tu nada mais sendo, apenas,
que o bom tempero de minha vida
refeição minha de todo dia
tu, picante iguaria
e choro eu, como pode?

ah! cebola
em cada meu bife acebolado
que extrato do meu coração tá tu
em cada glass onion
de fabulosos transes de meus romances tá tu
em cada réstia de mim mesmo
fatiada, tu picada tá tu
tu dourada em minha manteiga
ah! como tá tu, como tá tu!

cada camada que de ti descasco há
tu ali por dentro
outra de ti
em outra camada
em outro descasco
inteira sempre como fosses
só casca até o impossível centro
o interminável núcleo
ou desde fora até a casquinha derradeira
que escondes lá dentro
de tua infinita paciência
em eu fazer-me de ti meu chorar


eu te amo.
chorando eu ou não
ó cebola,
és minha toda
felicidade.
qualquer tristeza é falsa:
cortaria eu com o mesmo resultado
qualquer dobrado
de um pé de salsa

.

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